terça-feira, 27 de dezembro de 2011

Arroz: você prefere cru ou cozido?

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‘VOCÊ come arroz cru ou cozido?’ Seu anfitrião talvez lhe faça essa pergunta num lar indiano. Na Índia, cerca de 60% do arroz consumido é malequizado (pré-cozido). Mas talvez fique surpreso de saber que quase todo o mundo, nos países ocidentais, come o que os indianos chamam de arroz cru!
Nada disso talvez pareça tão estranho quando você entende que não estamos falando do modo de preparar o arroz para a refeição, mas do método que os indianos usam para beneficiar os grãos na época da colheita. Então, o que é feito no beneficiamento, e por quê? Um exame do arroz e de como o grão é preparado para servir como alimento dará respostas esclarecedoras.

Alimento básico de milhões de pessoas

Descobertas arqueológicas e registros antigos indicam que o arroz era cultivado na Índia e na China já no terceiro milênio AEC. Os antigos habitantes da Índia o chamavam de dhanya, “sustentador da raça humana”. Esse termo ainda é apropriado, porque mais pessoas subsistem à base de arroz do que de qualquer outro produto agrícola. A maior parte delas vive na Ásia, onde, segundo certa fonte, mais de 600 milhões de pessoas tiram do arroz metade do consumo calórico diário e onde se produz e consome mais de 90% do arroz do mundo.
O delta do Ganges, uma região úmida e tropical, é uma das principais áreas de produção de arroz no mundo. Chuvas copiosas e altas temperaturas, bem como muita mão-de-obra, fazem dessa região um lugar ideal para o cultivo de arroz. Aceitemos o convite dos amigos que temos nessa região, residentes em um vilarejo, e vejamos ao vivo a colheita e o beneficiamento do arroz.

A colheita do arroz

O ônibus nos leva a Jaidercote, na Bengala Ocidental, e prosseguimos a viagem ao interior, de jinriquixá de três rodas. Logo vemos os campos fervilhando de atividade. Nem sinal de colheitadeiras-batedeiras por aqui! O que se vê são pais, filhos, tios e irmãos atarefados nos arrozais, cortando punhados de hastes com toda a habilidade, num único golpe de foice. Um dos ceifeiros, percebendo que vamos fotografá-lo, termina logo de amarrar um feixe com um filamento de palha e o ergue, fazendo pose. Achamos graça de ver que o povo do vilarejo está sempre de olho nas oportunidades de sair em fotos.
Os feixes são postos a secar ao sol por um ou dois dias. Depois os membros mais jovens da família podem dar uma mãozinha, levando para casa, bem equilibrados na cabeça, pequenos fardos de feixes ressecados que vão fazendo aquele farfalho típico de palha.
Finalmente chegamos ao vilarejo. “Como está, Dada?”, cumprimentamos o anfitrião, usando um termo respeitoso. Seu sorriso nos diz que está tudo bem, e notamos sua esposa saindo às pressas para fazer chá.
Enquanto tomamos nosso chá matinal, perguntamos como vai a colheita do ano. “Até que não vai mal”, responde ele, reservado, como é típico dos lavradores, mas depois lamenta que, com o uso de sementes de alta produtividade nos últimos anos, os recursos do solo estejam sendo desgastados. No começo, elas produziam o que pareciam safras milagrosas, mas agora a história é muito diferente. Os fertilizantes químicos que as sementes de alta produtividade necessitam são caros, e ele não tem condições de comprá-los.

Debulha e malequização

Já terminando o lanche, incentivamos a família a continuar seu trabalho na colheita, que é o que viemos observar. Esta família praticamente já terminou a debulha. Um pouquinho mais adiante as mulheres da família vizinha estão atarefadas. Elas batem os feixes, um a um, numa plataforma de bambu, e os grãos vão caindo pelas fendas. A palha que sobra é empilhada numa meda.
O arroz não-beneficiado é recoberto por uma casca grossa, que é muito indigesta. Por isso, para quem prefere arroz cru, só fica faltando tirar a casca dos grãos, e talvez poli-los um pouco e remover as cutículas, se o produto for para o exigente mercado externo.
A safra aqui, porém, não é para exportação, mas será consumida pelas próprias famílias dos lavradores. Eles armazenam os grãos no tikri, o silo da família, com telhado de colmo. O povo do delta do Ganges em geral consome arroz pré-cozido, mas fazemos uma brincadeirinha com o nosso anfitrião, sugerindo que este ano ele consuma arroz cru.
“De jeito nenhum”, responde ele. “Nesta região estamos acostumados ao arroz pré-cozido. De qualquer modo, simplesmente não gostamos de arroz cru como gostamos do pré-cozido.”
Ouvimos falar que o arroz pré-cozido é preparado por um processo de embebimento e pré-cozimento, mas não sabemos bem como isso é feito. Felizmente nosso amigo se oferece para demonstrar o processo que sua família usa. Não há necessidade de equipamentos especiais, porque só uma pequena quantidade é preparada de cada vez, para atender às necessidades da família por uma ou duas semanas. Eles enchem uma panela enorme, a hanri, de grãos ainda na casca, armazenados no tikri, e acrescentam mais ou menos um litro de água. Isso vai ao fogo baixo do oonoon, um fogão a palha, até a água evaporar. Em seguida, os grãos ficam de molho a noite toda numa tina de água fresca e, depois que a água é escorrida, são postos outra vez na hanri para secar de novo. Por fim, são espalhados no chão para endurecer ao sol, sendo revirados vez por outra com os pés.
Para nós pareceu muito trabalho extra, mas esse processo tem vantagens, além de agradar à preferência da família. O processo de embebimento e pré-cozimento permite que certos nutrientes e vitaminas do arroz sejam bem absorvidos pelo endosperma, ou parte comestível, do grão ainda na casca. Isso impede que sejam facilmente perdidos em lavagens e no cozimento. Com isso as refeições ficam mais nutritivas. O valor alimentício adicional pode, de fato, significar a diferença entre a vida e a morte para as pessoas que subsistem principalmente de arroz.
Um benefício que os próprios lavradores apreciam mais de imediato é que os grãos malequizados duram mais e a casca sai mais fácil. Graças a isso e a um enrijecimento maior dos grãos, o arroz fica menos quebradiço.

O sabor do grão
“Está na hora para mais chá e um lanchinho”, diz o nosso anfitrião. Voltamos para sua casa, onde a dida (vovó) está preparando moori. Todo o mundo é louco por arroz pipocado, feito na hora, especialmente as crianças. A dida está acocorada junto do oonoon, tostando um pouco de arroz malequizado, sem casca, que ela já havia umedecido e misturado com um pouco de sal. Agora que os grãos estão secos e soltinhos ela os vai despejando aos poucos numa panela de ferro em que há areia quente. À medida que a areia vai esquentando, o arroz vai inflando até ficar várias vezes maior do que o normal. Depois de pronto, o moori é tirado bem rápido de cima da areia com um feixe de gravetos, antes que queime. Os gravetos também servem para punir as mãozinhas impacientes por beliscar no cesto de moori quente.
Saboreamos o moori com pedaços grandes de coco colhido na hora, mas com o cuidado de não comer demais, porque lembramos que já está quase na hora do almoço.
O último processo a ver é o descasque. Até pouco tempo atrás, isso era feito por pilão acionado por pedal, o dhenki, mas agora, mesmo em lugares remotos, descascadores mecânicos fazem esse serviço com muito mais rapidez. Algumas pessoas mais antigas lamentam essa mudança, já que os grãos descascados no dhenki conservam boa parte da pele (cutícula) interna, avermelhada, o que dá ao arroz um sabor característico e o deixa mais nutritivo. A máquina, porém, extrai tudo — casca, cutícula e grande parte do embrião — deixando só o endosperma branco e amiláceo, tão procurado hoje.
As mulheres estão ansiosas para nos ver saboreando o banquete que prepararam. Elas cozinharam o arroz malequizado, e agora ele está sendo colocado em montinhos fumegantes em folhas de bananeira que servem de prato. O arroz é acompanhado de lentilhas, legumes e peixe da lagoa. Todos concordamos que essa é uma das partes mais agradáveis da nossa visita.
Cru ou cozido, o arroz é uma delícia, uma das gramíneas que Deus fez brotar como “vegetação para o serviço da humanidade”. — Salmo 104:14.

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